Eles estavam ali. Simplesmente ali.
Ele sentado e ela de pé.
Sobre terra batida, sobre um caminho-de-ferro velho e ferrugento, já inutilizado.
O vento era quase inexistente e o calor suportável. Nada mais.
Ouvia-se ao longe um barulho de cancela a ser levantada e depois um comboio com o seu intenso barulho de maquinaria.
- Eu gosto de comboios.
Ouviu-se de novo, um som reproduzido pelo comboio, mas desta vez, mais longe.
- Eu sei. Eu também.
- Por causa do sossego e da paisagem que consegues ver?
Ela acenou que sim com a cabeça e o rapaz olhou para ela muito concentrado, como se não existisse mais nada no momento para ele.
E de facto, não existia. Com ela, nunca existia mais nada a não serem coisas superficiais.
- Pára de olhar para mim. Já te disse que não sou nenhuma ave rara.
Ele deixou escapar um pequeno riso. Um riso de criança, nada a ver com a mentalidade dele (por vezes) e a rapariga sorriu.
- É sossegado. – Ela olhou-o directamente durante uns segundos, à espera. – Isto. – O rapaz falou como se lhe estivesse a responder a alguma coisa e depois respirou fundo e fechou os olhos. – Sabes, a única maneira de teres a certeza de que vais apanhar o comboio, é perder o anterior. – Ele sorriu ainda com os olhos fechados. – Um bocado como a vida, não?
A rapariga sorriu também e cruzou os braços enquanto olhava para ele de cima.
- Quer dizer, temos muitos caminhos por onde escolher na vida. E por vezes queremos seguir um, mas chegamos atrasados, demoramos demasiado tempo a decidir. E aí, aprendemos a manter-nos na estação, demore o tempo que demorar, até a oportunidade chegar... – O rapaz abriu os olhos e pegou num pequeno pau que estava perto dele. Deixou-se rabiscar no chão e manteve o olhar baixo.
- Mas a vida muda. E na maior parte das vezes não tens direito a segundas oportunidades D. Por muito que queiras. E tu, melhor que eu, sabes disso.
- Não. – Ele largou o pau e cruzou as mãos, limitando-se a olhar para elas e para as linhas que as construíam. – A vida não muda. É sempre a mesma. Nasças como nasças, vais ser sempre o mesmo. Independentemente das mudanças que ocorram, das cicatrizes e de tudo o resto. – Pausa. – Um comboio com paragens é sempre o mesmo. Os passageiros saem e voltam a entrar; A saída de um dá lugar a outro. E por muito que as bagagens sejam diferentes e a personalidade igualmente, os que entram acabam por substituir perfeitamente os que saem. Querem todos o mesmo.
- Não digo que concorde com a tua teoria, – Carregou a última palavra. – Mas se assim o é, o que é que procuram?
- Fácil. O que tu procuras. O que eu procuro. O que aquele ou aqueloutro procuram. – Ela suspirou e sentou-se ao lado dele.
Aquela concentração por parte dele era tão intensa; a maneira como falava das coisas, como se tivesse realmente passado por elas, deixava-a na maior parte das vezes sem saber o que dizer.
O rapaz sorriu tristemente e depois levantou o olhar em direcção ao céu, onde o curto vento do momento lhe bateu de frente sem se importar.
- Respostas. Simplesmente respostas.
O problema é que há muitos comboios onde entrar e muitas estações por onde sair.
- Qual é que se escolhe? – Ele olhou para ela e a rapariga sorriu-lhe para lhe mostrar que estava sempre livre para ele.
- Aí é que está. Não se escolhe.
2 comentários:
gosto muito!
Gosto tanto destes teus textos :D
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